A BERD, empresa com sede em Matosinhos, concebe pontes modulares de rápida montagem que têm sido usadas em situações pós-devastação climática
Uma empresa portuguesa está a dar cartas quando é preciso reagir ao caos que se instala após as cada vez mais extremas manifestações da Natureza devido às alterações climáticas. Chama-se BERD, tem sede em Matosinhos e tem vindo a destacar-se a nível internacional ao fornecer soluções rápidas que asseguram a mobilidade quando estruturas tão fundamentais como as pontes são afetadas. Assim, a criação de pontes modulares, eficazes e de rápida montagem, tem sido uma aposta ganha pela BERD – Bridge Engineering Research & Design – e a empresa tem marcado pontos em países que passaram por situações extremas como aconteceu no Perú, com o “El Nino” ou em Moçambique, com o fornecimento de um conjunto de 40 pontes para restabelecer as ligações entre várias regiões afetadas pelas cheias particularmente fortes trazidas pelas monções, além de outros destinos em vários pontos do mundo. Projeto desenvolvido pelo departamento de I&D daquela empresa nortenha, desde 2015, com um forte cunho de inovação e de tecnologia, as características específicas destas pontes, construídas em fábrica e montadas no local como se fossem peças de Lego num tempo recorde que pode chegar a 10 dias, mereceram a atribuição do prémio especial internacional de uma das mais importantes instituições na área das estruturas e engenharia de pontes, a ECCS European Steel Bridge Awards 2022, numa cerimónia realizada em Instambul, no âmbito da 10ª edição do International Symposium for Steel Bridges for a Green Planet. Tudo indica que este segmento de negócios, ligados à resposta a situações de catástrofes naturais, está a conhecer os melhores anos para se expandir. Tão certo como a existência do aquecimento global, a atividade da BERD, literalmente empurrada por ventos e marés, veio para ficar. Pelo menos enquanto os alertas contra os fatores que estão a provocar Invernos e Verões cada vez mais extremos continuarem a não ter o eco suficiente em termos práticos. “Não há como negar ou dizer de outra maneira: para a área de pontes modulares o facto de haver alterações climáticas é um fator que amplia o mercado”, admite Pedro Pacheco, CEO da BERD. Por essa mesma razão é fácil perceber que Portugal, país com uma menor exposição a este tipo de risco, tenha apenas 5% da atividade da empresa… Profundamente envolvida no mercado externo desde o seu início (em 2006), a BERD marca presença internacional através de um roteiro que não tem apenas a ver com a venda de pontes modulares – que, aliás, só existe na empresa nortenha, como aposta desenvolvida especificamente, desde 2015 – mas também com o fornecimento (venda e aluguer) de equipamentos de alta tecnologia para a construção de pontes. Certo é, porém, que esta mais recente área das pontes modulares “que foi alvo de investimentos entre 2015 e 2018, já significa, no atual triénio, mais de 50% da faturação total”, segundo revela aquele responsável, apontando os países com maior impacto nestas contas: Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha, Perú e Moçambique. O prémio da ECCS é, assim, entendido como corolário deste esforço. A distinção incidiu sobre as pontes modulares da BERD no Perú “por representarem uma grande evolução ao nível da engenharia, com uma poupança de 20% no consumo de aço face aos projetos convencionais, com uma redução da pegada de carbono, tendo sido emitida menos 3.240 toneladas de CO2 comparativamente à média dos projetos tradicionais, a par de uma grande evolução estética”, dá conta a empresa, especificando que “o projeto potenciou ao Ministério dos Transportes e Comunicações peruano uma redução de custos na ordem dos três milhões de euros”. O concurso vencido pela BERD teve um valor de 17 milhões de euros para um pedido inicial de 125 unidades, depois aumentado para quase 150 e representava, a determinada altura, perto de um terço do total de novas pontes encomendadas pelo Estado peruano desde a última “birra” climática do “El Nino”. Para Pedro Pacheco, o referido prémio assinala “o reconhecimento da atividade desenvolvida bem como o investimento em I&D, o qual está na génese da empresa, dado que o negócio original da mesma está assente na exploração no mercado de uma patente sua”. Na realidade, a dinamização desta área de negócio gira em torno do sucessivo aporte de valor ao conceito base criado pelo engenheiro inglês Donald Bailey na Segunda Guerra Mundial, conceito esse que, durante várias décadas, foi mantido e utilizado com pequenas alterações por todos os construtores internacionais na área das pontes modulares. No caso da Berd, o upgrade de soluções passou pela experiência de engenharia no design e na execução de estruturas metálicas, o que lhe permitiu, juntamente com a aposta intensa no I&D, encontrar e disponibilizar propostas “inovadoras para o desenvolvimento e otimização” deste tipo de oferta, com estruturas “mais leves, de rápida instalação, fácil transporte e grande durabilidade”. O CEO da empresa explica com mais pormenor técnico: “A diferença está na concepção dos módulos, em que nós, por um lado, consideramos peças mais pesadas, ou seja, cada peça pode ser maior em dimensão, mas principalmente na questão do desenho: em vez de fazermos legos transversais fazemos legos longitudinais, o que torna a peça mais leve, mais estética, mais apelativa e com menos consumo de materiais; portanto, é uma concepção diferente, um paradigma diferente de pontes modulares. E foi isso que foi premiado, ou seja, o impacto económico e na sustentabilidade que este novo conceito que nós desenvolvemos tem”. A empresa portuguesa conquistou também a liderança a nível da Europa no segmento de cimbres autolançáveis. Os cimbres são armações de madeira ou metal, que servem de molde durante a construção de um arco. De facto, apesar da forte concorrência no sector – onde os países com maior peso são os Estados Unidos, China e Inglaterra – a BERD tem conseguido fazer valer as suas propostas no mercado global, como bem o comprova o concurso vencido no Perú e o registo de clientes e projetos nos cinco continentes. Para além da redução de custos e da pegada de carbono, a opção pelas pontes modulares, em detrimento das pontes convencionais, prende-se, também, com um fator essencialmente prático em situações de calamidades. “Eu diria que o impacto maior tem a ver com o prazo: uma ponte convencional, projetada e construída em tempo recorde, demora sempre vários meses até aparecer. Já uma ponte modular pode estar montada em 10 dias depois da catástrofe!”, sublinha Pedro Pacheco. No caso das pontes enviadas para o Perú, com vãos de 20 a 60 metros, “tipicamente, tiveram um tempo de montagem de duas semanas”. No restante, porém, convém perceber que a comparação com as pontes convencionais não pode ser direta “porque que o que é exigido a uma ponte permanente não é necessariamente exigido a uma ponte modular”, nomeadamente quanto à durabilidade, que oscila entre 20 a 25 anos no caso destas últimas, o que corresponde a cerca de metade das pontes rodoviárias convencionais. Já quanto ao peso suportado “os requisitos são muito próximos”, garante o responsável. Produzindo soluções de massa cinzenta nas áreas de engenharia e gestão, a empresa de Matosinhos manda, depois, fabricar os seus produtos em vários pontos do mundo, numa geometria variável de acordo com as conveniências de custos para a empresa. “Isso, claro, tem muito a ver com, por exemplo, a política cambial dos vários países e também com a moeda”, confirma o seu CEO, adiantando que, nesse sentido, “temos fornecedores muito importantes na Turquia (onde foi integralmente feita a parte industrial da encomenda para o Perú), temos fornecedores importantes no Vietname, mas também no México, na Alemanha e em Portugal”. Fundada em 2006, a BERD obteve uma faturação média anual de 10 milhões de euros no último triénio e tem o seu caminho para o futuro perfeitamente identificado. “Neste triénio a BERD está a investir mais de 22% dos custos fixos anuais em investigação e desenvolvimento (I&D). Aliás, a empresa está neste momento a fazer o maior investimento de sempre da sua história e que há de trazer resultados, numa escala diferente, dentro de três anos”, antevê Pedro Pacheco. As crescentes intempéries em vários pontos do globo também parecem querer ajudar…
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