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Não sou espanhol, mas sou o Espanhol!


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O apelido “Espanhol” veio de uma história da minha juventude. Quando eu tinha 14 anos, fugimos eu e o meu amigo Manel para Espanha, entre 1968 e 1970. Saímos de Matosinhos escondidos debaixo da lona de uma camionete de peixe, e apesar de sermos portugueses, a vizinhança, ao saber que tínhamos vindo de Espanha, começou a chamar-nos “os espanholitos”. Foi assim que o apelido ficou, e depois os meus filhos e netos também ficaram conhecidos assim, mesmo sem qualquer ligação ao sangue espanhol.

Naquela aventura, passámos por Monção, onde um motorista nos convidou para tomar o pequeno-almoço e nos ajudou a chegar até lá, apesar de querermos continuar para Espanha. Depois, fomos para Melgaço, onde uma senhora nos indicou como passar o rio perigoso. Depois de atravessar pelos montes, chegámos finalmente a Espanha, onde ficámos oito dias. Comer era um desafio e muitas vezes roubávamos fruta do passeio para sobreviver. Depois a polícia espanhola apareceu, levou-nos para a esquadra e, eventualmente, fomos entregues à polícia portuguesa, que nos devolveu aos nossos pais, que já estavam aflitos e até pensavam que íamos ser levados para o mar para nos afogarem. A vizinhança, ao ver-nos, dizia “já chegaram os espanholitos”, e assim o apelido pegou.

Mais tarde, eu estava ligado ao futebol e tinha um bar em Leça. Foi aí que comecei a criar amizades com árbitros e dirigentes, especialmente com o Reinaldo Teles, que me apoiava. Comecei a pensar em abrir um espaço para vender umas sandes e copos de vinho, e a minha mulher apoiou-me. Assim nasceu a tasca, que começou modesta, vendendo moelas e copos, mas que depressa ganhou fama pelo peixe assado no forno e pelo arroz de cabidela. Para criar um ambiente mais adequado, afastei os clientes que só vinham beber e jogar cartas, e passei a receber árbitros, presidentes de clubes e outras figuras ligadas ao futebol.

A tasca “Espanhol” começou a atrair pessoas de renome, desde políticos e artistas até jornalistas e desportistas. Uma pessoa que me marcou muito foi a Judite Sousa, que atravessava uma fase complicada e que encontrava na tasca um refúgio, onde eu a fazia rir e se sentia bem. Também a amizade com o Quim Barreiros é especial. Ele apareceu um dia no restaurante, sem nos conhecermos, e disse que eu era o “verdadeiro Espanhol”, oferecendo-me um acordeão. Desde então, mantemos uma amizade forte, e ele ajudou-me até nas televisões.

Aqui passaram muitos treinadores e jogadores famosos, que até davam entrevistas na sala reservada do restaurante. O ambiente é sempre de amizade e alegria, e eu, muitas vezes, pego no acordeão para animar as pessoas. O segredo do sucesso da tasca está na combinação da qualidade da comida, o ambiente acolhedor, e o carinho do staff, que inclui a minha família. Os pratos que mais saem são o misto de peixe, o arroz de tamboril, o bacalhau assado na brasa e o arroz de peixe-galo.

Muitas vezes confundem-me com o Quim Barreiros, e isso até me diverte. Mas o que importa é que o “Espanhol” é uma marca de Matosinhos, reconhecida pela sua autenticidade, pela comida e pela alegria que transmite. Essa é a verdadeira essência da tasca, e é isso que faz com que as pessoas gostem de voltar e se sintam em casa.

 

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